A doença predomina nas classes menos favorecidas

Leishmaniose e Doença de Chagas têm muito em comum: são transmitidas por vetores, insetos e são consideradas negligenciadas, ou seja, afetam a população mais pobre. As duas estão presentes em diversas regiões do Brasil.

Segundo Márcia Hueb, infectologista e professora da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), a leishmaniose é uma doença infecciosa não contagiosa. Existe a leishmaniose tegumentar, que pode causar lesões na pele e nas mucosas; e a leishmaniose visceral, que acomete vísceras e órgãos internos. “Essa é uma doença que não desperta o interesse da grande indústria, porque não vai reverter em lucro. São doenças que acometem populações muito empobrecidas, negligenciadas”.

O aposentado Benedito Cambará ficou 20 dias internado no Hospital Universitário Júlio Müller, em Cuiabá, em decorrência da leishmaniose, que afetou a mucosa da boca. Alguns dias depois que recebeu alta. Foi a segunda vez que o aposentado fez tratamento para leishmaniose. Na primeira vez, ele interrompeu a medicação e agora, na segunda, a filha, Aparecida, se encarregou de supervisionar o tratamento.

A leishmaniose é causada pelo protozoário leishmania e transmitida pela picada da fêmea de um inseto popularmente conhecido como mosquito palha. Também transmitida por um inseto – o barbeiro – a Doença de Chagas é considerada a mais brasileira das doenças tropicais. A transmissão ocorre pelas fezes do barbeiro depositadas sobre a pele da pessoa, enquanto o inseto suga o sangue. A picada provoca coceira, facilitando a entrada do tripanossomo no organismo, o que também pode ocorrer pela mucosa dos olhos, do nariz e da boca ou por feridas e cortes recentes na pele. Outras formas mais comuns de transmissão são por via oral e transmissão vertical pela placenta (mãe para filho).

A Casa de Chagas, no Recife, em Pernambuco, foi a primeira totalmente dedicada ao tratamento de Doença de Chagas no mundo. A instituição é considerada referência no país e todos os dias recebe, em média, 60 pacientes, que vão para consultas, exames e o controle do marca-passo, utilizado por muitas pessoas com a doença.

“Aqui no ambulatório são atualmente 850 pacientes cadastrados, e a gente vê claramente que a doença predomina nas classes menos favorecidas. Isso é algo também que dificulta o tratamento dessas pessoas, que muitas vezes não tem acesso”, explica o médico cardiologista Wilson de Oliveira, professor na Universidade Federal de Pernambuco.

Jadel Muller Kratz, gerente de Pesquisa e Desenvolvimento da DNDi, afirma que nos últimos 40 anos menos de 1% dos medicamentos produzidos no mundo foram para as doenças tropicais negligenciadas, como Chagas e Leishmaniose. Ainda hoje há poucas opções de tratamento, e os medicamentos existentes são tóxicos, com muitos efeitos colaterais e difíceis de serem usados em áreas distantes.

A aposentada Severina da Silva foi picada por um barbeiro contaminado ainda quando jovem. Hoje, aos 91 anos, ela tem que conviver diariamente com os medicamentos para o coração, afetado pela Doença de Chagas. Desde a década de 80, ela faz trabalho voluntário na Casa de Chagas e ajuda outras pessoas que também têm a doença. “Eu gosto de ajudar e me sinto bem quando faço qualquer coisa para uma pessoa. Eu acho que estou fazendo aquilo ali para o meu bem, não para o bem do outro, porque se me sinto feliz vou melhorar cada dia mais”.

Com informação/EBC

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